A importância do exercício físico confirmada por estudo clínico

Por: Renato Astur | 11 de julho de 2025

CHALLENGE Trial, apresentado na ASCO 2025: Exercício Físico Estruturado Após Quimioterapia Adjuvante no Câncer de Cólon – Resultados Finais

 

*Comentando por Dr. Fernando Baracho.

O CHALLENGE Trial foi outra grande novidade apresentada na ASCO 2025. O maior congresso médico do mundo trouxe muitas novidades em termos de novas terapias e tecnologias, que em geral estão associadas a custos elevados, sobretudo devido a todo investimento realizado durante a fase de desenvolvimento das drogas e das pesquisas clínicas. A prática de atividade física,  intervenção do estudo clínico tema da discussão deste artigo, entretanto, é a mais acessível de todas e com base nos dados que vamos analisar a seguir deverá ser fortemente estimulada.

O câncer de cólon é a terceira neoplasia mais comum e a segunda principal causa de morte por câncer no mundo. Apesar dos avanços no tratamento adjuvante com esquemas como FOLFOX e CAPOX, cerca de 20 a 40% dos pacientes com câncer de cólon estádio III ou II de alto risco apresentarão recorrência da doença. Além disso, a cirurgia e a quimioterapia impactam negativamente a qualidade de vida e a capacidade funcional dos pacientes.

Estudos observacionais sugerem uma associação entre maior atividade física após o tratamento oncológico e melhores desfechos de sobrevida. No entanto, até o presente estudo, não havia evidência de nível 1 que confirmasse um benefício causal. O estudo CHALLENGE (Colon Health and Life-Long Exercise Change Trial) foi desenhado para preencher essa lacuna.

Metodologia

  • Desenho: Estudo fase 3, randomizado, multicêntrico, controlado.
  • Período: 2009 a 2024.
  • Centros participantes: 55 centros (principalmente no Canadá e Austrália).
  • População-alvo: Pacientes com adenocarcinoma de cólon estádio III ou II de alto risco, com cirurgia curativa e quimioterapia adjuvante concluída entre 2 e 6 meses antes da inclusão.

Critérios de inclusão principais:

  • ECOG 0–1.
  • Atividade física prévia inferior a 150 minutos por semana de intensidade moderada a vigorosa.
  • Aptidão física mínima documentada por teste submáximo de esforço ou teste de caminhada de 6 minutos.

Intervenções:

  • Grupo Exercício (n=445): Participação em um programa de exercício físico estruturado de 3 anos, com metas de aumento de ≥10 MET-horas/semana de atividade aeróbica moderada a vigorosa. Incluiu sessões presenciais e suporte comportamental.
  • Grupo Controle (n=444): Recebimento apenas de material educacional de saúde.

Desfecho primário:

  • Sobrevida livre de doença (DFS): tempo até recorrência, novo câncer primário ou morte por qualquer causa.

Desfechos secundários:

  • Sobrevida global (OS).
  • Função física autorreferida (questionário SF-36).
  • Condicionamento cardiorrespiratório (VO2 previsto).
  • Distância no teste de caminhada de 6 minutos.
  • Eventos adversos relacionados à intervenção.

Resultados

Características da população

  • Total randomizado: 889 pacientes.
  • Mediana de idade: 61 anos (19 a 84).
  • Sexo feminino: 51%.
  • Estadiamento: 90% com câncer de cólon estádio III.
  • Esquemas de quimioterapia: FOLFOX (61%), CAPOX (14,5%), capecitabina isolada (16,9%).

Adesão ao programa de exercício

  • Alta adesão nas fases iniciais (>80% nas sessões comportamentais e supervisão de exercício).
  • Adesão decrescente nas fases subsequentes, mas com manutenção de níveis elevados de atividade física em comparação ao grupo controle.

Desfechos de Sobrevida

Desfecho Grupo Exercício Grupo Controle Diferença Absoluta Hazard Ratio (HR)
5 anos de DFS 80,3% 73,9% +6,4 pontos percentuais 0,72 (IC95%: 0,55–0,94; p=0,02)
8 anos de OS 90,3% 83,2% +7,1 pontos percentuais 0,63 (IC95%: 0,43–0,94)
  • Redução de 28% no risco de recorrência ou morte no grupo exercício.
  • Redução de 37% no risco de morte por qualquer causa.

Eventos Adversos

  • Eventos musculoesqueléticos: 18,5% (exercício) vs. 11,5% (controle).
  • Eventos grau ≥3: 15,4% no grupo exercício e 9,1% no controle.
  • Nenhum sinal inesperado de segurança.

Análise de Qualidade de Vida e Condicionamento Físico

  • Melhorias significativas na função física autorreferida (SF-36) no grupo exercício durante todo o período de intervenção de 3 anos.
  • Ganho de condicionamento cardiorrespiratório: aumento de 1,3 a 2,7 ml/kg/min de VO2 previsto no grupo exercício.
  • Aumento de atividade física semanal de aproximadamente 5,2 a 7,4 MET-horas/semana a mais do que o grupo controle.

Discussão

O CHALLENGE é o primeiro estudo fase 3 com evidência nível 1 a demonstrar que uma intervenção estruturada de exercício físico, iniciada precocemente após quimioterapia adjuvante para câncer de cólon, melhora significativamente a sobrevida livre de doença e apresenta uma tendência de melhora na sobrevida global.

O ganho de sobrevida, em termos de redução de risco relativo, é comparável ao de muitos tratamentos medicamentosos aprovados. Os benefícios foram consistentes em praticamente todos os subgrupos analisados.

Os mecanismos propostos incluem efeitos do exercício na imunidade, inflamação, sensibilidade à insulina e controle de micrometástases.

Limitações

  • Baixo número de eventos (apenas 224 dos 380 planejados), o que limita a robustez estatística para OS.
  • Longo tempo de recrutamento (15 anos).
  • Possível viés de seleção para pacientes com melhor performance física.
  • Falta de avaliação de variantes genéticas (ex: síndrome de Lynch).
  • Auto-relato de atividade física, sujeito a viés de memória.

Pontos Fortes

  • Primeiro RCT com desfecho de sobrevida em câncer de cólon testando intervenção de exercício.
  • Longo seguimento mediano: 7,9 anos.
  • Ampla representatividade geográfica.
  • Medidas objetivas de condicionamento físico validadas.
  • Alta taxa de adesão nas fases iniciais.

Conclusão Final

       O estudo CHALLENGE demonstra que programas estruturados de exercício físico devem ser considerados parte integrante da abordagem pós-tratamento de pacientes com câncer de cólon, com benefício clínico significativo em sobrevida e qualidade de vida.

Referencia:

  • Artigo publicado no NEJM em 01 de junho de 2025 em paralelo a sua apresentação na ASCO 2025. (DOI: 10.1056/NEJMoa2502760)
  • Fonte:  site www.realoncologia.com.br